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ESPECIAL - Cinema? No Piauí?

16/09/2013 17:02

Você gosta de cinema? Você sabe alguma coisa sobre cinema? E sobre o cinema do Piauí? Se você acha que não há produção de filmes, então, está na hora de conhecer um pouco mais sobre o que é produzido aqui. Nas páginas seguintes, você vai ser apresentado a história do cinema piauiense, aos principais diretores e as dificuldades que cercam a realidade do cinema local, ou melhor, nas produções áudio visuais. 

 

Afinal, existe cinema no Piauí?

Cinema, conceituado de um modo geral é a técnica de reproduzir imagens em movimento. Levando em consideração esse conceito, pode-se dizer que há sim cinema no Piauí. Mas pessoas ligadas ao cinema piauiense, dizem que não se pode falar que há cinema aqui. Os próprios produtores locais, como é o caso de Monteiro Júnior, Cícero Filho e Franklin Pires afirmam, com convicção, que o que existem são apenas pro-duções audiovisuais. Para entender isso basta entender que eles falam de uma Indústria Cinematográfica, o que, de fato, não existe.

No Piauí, não existe nenhuma empresa prestadora de serviço às produções. Por exemplo, o aluguel de figurinos não vem de uma empresa especializada em figurino para filmes. Nas produções, os cenários usados são naturais, como as casas dos próprios diretores e responsáveis. Até mesmo os equipamentos de fotografia, luz e som são precários. Além disso, não existe uma distribuição – que também acaba sendo responsabilidade do diretor. Resumindo: não existem empresas que se envolvam diretamente nas diversas etapas da fabricação desse produto artístico.

Existem apenas pessoas com vontade de fazer algo, pessoas que devem, praticamente sozinhas, correr atrás de patrocínios e modos de produzir aquilo. Isso acaba resultando no que nós temos hoje para o chamado “Cinema Piauiense”, ou melhor, produções audiovisuais.

 

Breve contexto histórico do cinema no Piauí

A primeira sessão pública de cinema ocorreu no Salão Grand Café, em Paris, organizada pelos irmãos Lumière em 28 de dezembro de 1895. Em um evento que reuniu pouco mais de 30 pessoas e teve como ideia principal apresentar o seu invento, o Cinematografo.  Ao o inventarem, os irmãos Lumière não tinham grandes pretensões e nem acreditavam no sucesso de sua criação. Mas a apresentação dos filmes causou um verdadeiro alvoroço e a notícia se alastrou, atingindo diversos lugares no mundo. Em julho de 1896 ocorre a primeira exibição cinematográfica no Brasil e entre os anos de 1897 e 1898  

foi filmado, por Afonso Segreto, o primeiro filme brasileiro, “Vista da baia da Guanabara". No Piauí, as primeiras exibições experimentais de filmes datam de 1901, trazidas por empresários estrangeiros. Em Tere-sina as exibições inicialmente aconteciam no Theatro 4 de setembro.

Nas décadas seguintes, as sessões de cinema se configuraram como a principal diversão do piauiense, acompanhando uma tendecia mundial. Surgem na capital, vários cinemas de rua, como Cine Royal, Cine São Luis, Cine Rex (inaugurado em 26 de novembro de 1939), entre outros. Entretanto, somente na década de 70 ocorreram as primeiras produções legitimamente piauienses. Na praça da Liberdade, onde se encontra a Igreja São Benedito, próximo ao Cine Rex, um grupo de jovens se reunia, sentados na gramas da praça a falar de cinema e mudanças, compartilhando da vontade de que a população piauiense se aproximasse mais de manifestações culturais. Assim, Paulo José Cunha, Edwar Oliveira, Arnaldo Albuquerque, Carlos Galvão e Durvalino Couto Filho criaram o jornal alternativo “Gramma”, que a partir de uma entrevista com o poeta e cineasta piauiense Torquato Neto, nasce o primeiro curta-metragem de produção regional, Adão e Eva do Paraíso ao Consumo, protagonizado pelo próprio e por Claudete Dias. Com esse projeto estimulou-se a rea-lização de filmes locais.

Alguns movimentos cinematográficos de grande impacto no cinema brasileiro, como a chanchada, por exemplo, não tiveram grande influência no cinema piauiense. Porém, o Cinema Novo, movimento brasileiro influenciado pela Nouvelle Vague, da França, e pelo Neo-realismo, da Itália, instigou nos jovens a vontade e a coragem a concretizarem criação de Cineclubes na região.

No Piauí, onde as discussões contra a ditadura, os trabalhos de luta e as forças sindicais não eram tão fortes e presentes, o Cinema Novo não se desenvolveu tão plenamente. O cinema piauiense seguiu a vertente do cinema marginal, o filho bastardo do Cinema Novo. De acordo com Torquato, “Cinema é um projetor funcionando, projetando imagens em movimento sobre uma superfície qualquer. É muito chato. O quente é filmar”. Em decorrer disso, o caráter marginal das produções piauienses só se acentuaram. Dispensando as fórmulas tradicionais de narrativa e estética e embasando-se no cinema experimental.

 Depois da morte de Torquato Neto, no início da década de 80, surge um novo grupo, conhecido como “Mel de Abelha”, que realizou sete curtas: Povo Favela, Pai Herói, Relógio do Sol, Espaço Marginal, O pa-gode de Amarante, Dia de Passos e Da Costa e Silva. Nessas produções há uma preocupação em resgatar as tradições culturais do Estado, porém não obteve visibilidade.

Nos anos 90, começam a acontecer as iniciativas isoladas que continuam até hoje, de jovens crescidos na geração dos videoclipes, curtas e documentários. Nessa década em diante, não se identificou a formação de um movimento especifico, apenas iniciativas isoladas e produções de estilo amador e experimental. O mais próximo que se chegou da constituição de um movimento, foi o Kitupira, idealizado pelo o jovem cineasta Alan Sampaio. Contudo, com sua morte precoce no Natal de 2007 não houve tempo para o movimento se concretizar. 

No final dos anos 2000 algumas produções piauienses começaram a tentar fugir desse caráter “marginal”, mesmo ainda sendo realizadas em condições precárias. Fazendo longas-metragens, com temáticas populares, normalmente, envolvendo drama e comedia, e alguns até de grande alcance nacional, como “Ai, que vida!”, do Cicero Filho.

 

Principais Nomes

Talvez citando o nome Cícero Filho, ninguém consiga associar ou entender rapidamente sobre quem se trata. Mas falar no filme “Ai que vida!” significa falar em algo que praticamente todo piauiense conhece, aliás, seria uma desonra para eles não conhecerem essa obra. Cícero Filho é um cineasta nascido no Mara-nhão, mas radicado em Teresina, Piauí. Filho do dono de uma emissora de televisão, desde criança usava os equipamentos do pai para ensaiar as suas primeiras produções. Em Teresina, formou-se em Jornalismo e contou com o apoio da Faculdade Santo Agostinho para a realização de seus filmes, em 2006, lançando “En-tre o Amor e a Razão”; em 2007, o tão conhecido “Ai que vida!” e em 2011, Flor de Abril.

Cícero Filho não soube apenas trabalhar o regionalismo nos seus filmes, como aproveitou da onda da pirataria para promovê-los e, desta forma, atingir um grande público. Além disso, ele pessoalmente levou os filmes para exibição nos shoppings da cidade (Teresina Shopping e Riverside). A capacidade dele de explo-rar o lado cômico do piauiense foi tão grande, que o grande sucesso “Ai que vida” é um dos únicos filmes a ser lembrado quando a população é questionada sobre cinema piauiense. 

Monteiro Júnior, nascido em Teresina, é outro nome que faz parte do que chamamos de Cinema Pi-auiense. Talvez ele seja menos conhecido por seus filmes do que por sua grande capacidade de falar sobre cinema, diretor do curta Insone (2005), No meio do caminho (2004), Dona Maria (2010) e Qualquer hora dessas (2012), ele trabalha como crítico de cinema para alguns jornais e portais de Teresina, além disso, já ministrou diversas vezes na Universidade Federal do Piauí o curso “Pela Lente”, em que ele ensina sobre roteiro e direção, principalmente. Atualmente, ele ministra um curso de cinema na Casa da Cultura (Teresina, Piauí).

Ao falar dos principais nomes, Douglas Machado não poderia deixar de ser citado, consagrado como documentarista, já dirigiu também um filme de ficção, Cipriano (2001) que apresenta o povo piauiense de forma dramática e profunda. Douglas Machado, dentro de suas limitações, possui uma extrema competência técnica e possui obras que procuram ressaltar o lado mais humano possível, caso dos documentários: “Um homem particular”, sobre H. Dobal, “O sertão mundo de Suassuna”, sobre Ariano Suassuna, “O artesão da palavra” que faz referência a Marcos Vinicios Vilaça, entre outros.

Um dos mais recentes navegantes dessa história de cinema do Piauí, é o ator e diretor Franklin Pires, conhecido por seu trabalho em “Mocambinho – o filme”, lançado no final de 2011, que também conseguiu uma grande visibilidade entre os teresinenses por homenagear de forma engraçada o bairro Mocambinho, Franklin Pires também soube explorar o lado piauiense que cativa as pessoas. Além disso, ele apresentou o filme diversas vezes, no Theatro 4 de Setembro, na Sala Torquato Neto do Clube dos Diários, no Ginásio Pato Preto no Mocambinho e em Viradas Culturais. Com o intuito de levar cada vez mais pessoas até o filme, recusou o horário que os Cinemas dos Shoppings disponibilizaram, alegando não valer a pena e ser im-praticável em uma cidade quente como Teresina.

 

Mídia piauiense e o cinema

Nos meios de comunicação, aos poucos o assunto, Cinema, vai aumentando sua dimensão nos veículos. Ele tem permeado programas e quadros de portais, blogs, jornais impressos e televisão. No geral, os canais destinam pouco tempo para tratar desse tema e/ou falam de tópicos mais amplos, como sinopses de filmes, lançamentos da semana, artistas. Apenas duas emissoras de Tv locais, têm programas exclusivos para o Ci-nema. Dois dos principais jornais do Estado trazem criticas mais elaboradas, assim como, alguns portais. 

Nessa abordagem, o cinema local tem mais “destaque”, mesmo que brevemente, as produções são, quase sempre, comentadas ou exibidas. O tratamento dado a elas varia em cada emissora. Porém, se comparado a outras capitais, aqui ainda aborda o cinema, tanto de uma forma geral quanto a produção local, de maneira muito limitada.

 

Mostras e festivais

De acordo Agência Nacional do Cinema (ANCINE), segmento de Mostras e Festivais é uma das maio-res vitrines da produção audiovisual brasileira e já existem até incentivos legais para que se realizem. Dando-se a chancela do órgão oficial de regulação do mercado audiovisual e com a isenção da CONDECINE para as obras exibidas nos festivais, tencionando que esses eventos possam cumprir um papel eficaz para o estimulo da produção e divulgação de filmes. 

Muitas vezes, as mostras e festivais são a primeira porta de entrada de uma obra audiovisual, além de serem os principais canais de difusão de obras de novos realizadores, de curtas-metragens e de produções nacionais e estrangeiras não exibidas em circuito comercial. Assim, a realização de mostras e festivais repre-senta um estimulo à exibição cinematográfica e a possibilidade de levar o cinema e a produção audiovisual até o público nas cidades mais distantes.

No Piauí ainda são realizadas poucas mostras e festivais, mas aos poucos, essa é uma realidade que tem se alterado, pois a realização desses eventos tem estabelecido um crescimento continuo. Exemplos disso são o Festival “Encontro Nacional de Cinema e Vídeo dos Sertões” e a “Mostra de Cinema e Direitos Huma-nos”.

 

Distribuição/Divulgação

No Piauí, existem apenas dois Cinemas, representando um total de 10 salas, arrecadando no ano passa-do, um total 5.166.909,00 reais. Seguindo a linha mundial diante de filmes, o público piauiense demonstra bastante interesse pela Sétima Arte. Reflexo disso são as instalações nos próximos anos de mais salas de cinema, a previsão é que totalizando os que serão feitos em shopping somam um pouco mais de 20 novas salas.

Porém, mesmo com essa procura a produção “cinematográfica” piauiense, não encontra muito espaço nos cinemas locais. Assim, a maioria do que é produzido aqui, é exibido em mostras ou outros estabelecimentos, como a Casa da Cultura. Em geral, adquirir esses filmes é bastante complicado, pois não há uma divulgação adequada e não se encontra facilmente em lojas ou na internet. 

Talvez esse ponto tenha sido crucial para a estimulação da pirataria com os filmes locais, pois por esse meio, filmes piauienses recentes conseguiram atingir uma grande quantidade de público e certa visibilidade. Uma das dificuldades no nosso cinema vai além da produção, a pouca divulgação e a má distribuição dos filmes, levam o público a cultivaram inúmeros preconceitos a cerca disso e na maioria dos casos, crer que no Piauí não há produção de filmes.

 

Incentivos

Desde 1897, dois anos após a apresentação do cinema ao mundo, o Brasil começa a realizar a produção de filmes. No Piauí, a realização de projetos cinematográficos começou a ocorrer durante a década de 60. Mas mesmo assim, até os anos 80 não havia nenhuma lei de incentivo ao cinema. Em meio a esse contexto, todo o desenvolvimento do audiovisual no Piauí era de inteira responsabilidade de seus criadores, realidade que não difere muito da atual. Leis de incentivo, políticas públicas, financiamento e pesquisas ainda eram muito escassas.

Porém os incentivos criados durante a década de 80, além de instituições já existentes, foram extintos durante o governo de Fernando Collor, no inicio da década de 90. Levando assim, o Brasil e o Piauí, a um regresso no desenvolvimento da produção cinematográfica. Mas nos governos seguintes, mesmo que timi-damente, começaram a surgir instituições, leis e outras formas de apoio para os interessados em trabalhar com cinema.

Mesmo assim, a produção audiovisual (ou cinematográfica, de um modo geral) piauiense esboça um de-sajuste dentro da história do cinema nacional, na maneira que se operaram suas bases e transformações. Essa situação gerou um olhar peculiar e particular sobre a produção local. No Piauí, ainda perdura o costume das iniciativas isoladas, mas aos poucos. Os editais, as leis de incentivos e o apoio das empresas privadas come-çam, timidamente, a fazer parte do trabalho dos cineastas do Estado. A televisão tornou-se um dos maiores apoios, com programas voltados para cinema e exibição de curtas-metragens locais. Assim como tem acon-tecido mais festivais e mostras de filmes locais, com público maior a cada ano.

Atualmente, existem diversas leis e instituições para o fomento da realização de filmes no Brasil. Como por exemplo, os mecanismos de incentivo fiscal dispostos na Lei 8.313/91 (Lei Rouanet), na Lei 8.685/93 (Lei do Audiovisual) e na Medida Provisória 2.228-1/01, que permitem que contribuintes, pessoas físicas e jurídicas, tenham abatimento ou isenção de determinados tributos, desde que direcionem recursos, por meio de patrocínio, coprodução ou investimento, a projetos audiovisuais aprovados na ANCINE. Além de leis municipais, Lei A. Tito Filho (Lei nº 2.194) foi criada em 1993 e que atualmente traz o valor de R$ 1 milhão do Fundo Municipal de Cultura para a realização de projetos, e estaduais, a Lei nº 4.997/97, a Secre-taria de Cultura, via Fundac, promove o SIEC (Sistema de Incentivo Estadual à Cultura), além de financia-mentos ofertados por empresas privadas.

 

O que falta? O que precisa melhorar?

Para começar, o melhor “curso de cinema” disponibilizado no Piauí, é um oferecido pela Casa da Cultura e ministrado pelo cineasta, psicólogo e estudante de Comunicação Social, Monteiro Júnior. Com uma duração de seis meses, o curso, infelizmente, não possui a infraestrutura necessária, até mesmo pelo próprio preço e duração. As Universidades e Faculdades piauienses apresentam cursos de Comunicação Social, mas em grande maioria com habilitação apenas em Jornalismo, Publicidade e Recursos Humanos. Isso se deve, principalmente, ao fato de que um curso de tal amplitude e riqueza, exija muito mais do que elas podem ofe-recer. Inclusive, aplica-se aí a lei de oferta e da procura, pois, na verdade, poucas pessoas se interessam de fato pelo estudo dessa área e as que se interessam se vêm obrigadas a ir para outros Estados, onde a maioria das aulas são práticas e feitas em laboratórios dedicados à fotografia, montagem e sonorização.

Isso evidencia o despreparo dos que deveriam ser profissionais da área de audiovisual aqui. Além disso, há preconceito com o cinema piauiense e a dificuldade de encarar o próprio público, que ama filmes, mas somente idolatra as grandes explosões e superproduções Hollywoodianas. Em uma pesquisa realizada por estudantes da Universidade Federal do Piauí, 90% dos entrevistados declararam preferir filmes internacio-nais. 

Para o Monteiro, o Cinema Piauiense precisa urgentemente de uma atualização no modo de se produzir, mas precisa também de um público diferente. O último filme dele, Qualquer hora dessas (2012) foi levado para a Europa, onde ele acredita ter um público maior para o tipo de obra experimental que o “Piauí” permite produzir. Ele citou em entrevista o filme “A Árvore da Vida”, de Terrence Malick, que mesmo com atores de grande visibilidade não conseguiu sensibilizar o público piauiense, ficando em cartaz por apenas uma semana. Para os demais nomes ligados ao cinema do nosso Estado, a questão é o investimento. Eles acreditam ter ideias suficientemente boas, mas que não são bem exploradas por falta de dinheiro. Já artistas ligados ao cinema marginal – aquele cinema que só exige, de fato, uma câmera – ressaltam principalmente a falta de apreciação do público para com o estilo piauiense. 

Para resumir, precisamos de: cursos profissionalizantes, boas ideias, investimentos, empresas de apoio cinematográfico, incentivos menos burocráticos, oportunidades para novos nomes e, principalmente, que não haja mais acomodação, tanto por parte de quem quer fazer cinema quanto pelo próprio público, que não tem coragem de ver uma produção piauiense pela ideia negativa que já é predeterminada. 

 
 
Por: Isadora Gomes, Renata Fortes, Tácio Batista e Teresa Albuquerque

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