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CNPq quer modernizar os instrumentos de gestão de C&T
06/04/2011 15:20
Como o senhor avalia o cenário de Ciência e Tecnologia no País?
Glaucius Oliva: A ciência brasileira tem progredido de forma expressiva. Ainda que o Brasil seja um País jovem - quando se fala de pesquisa científica - e com muitos desafios pela frente para aperfeiçoar sua política de CT&I, vemos que o Brasil tem conseguido promover um contínuo crescimento na formação e capacitação de profissionais voltados para a geração de conhecimento. Nossas universidades mais antigas ainda nem completaram um centenário, e só a partir dos anos 80 nossos indicadores de ciência e tecnologia realmente começaram a se sobressair. Ainda assim, hoje já produzimos 2,7% de toda a ciência mundial e temos liderança reconhecida em várias áreas do conhecimento, como a agricultura tropical, a geofísica e a engenharia associada à prospecção de petróleo e gás em águas profundas, e a parasitologia, apenas para mencionar alguns exemplos. Atualmente, temos uma respeitável comunidade científica e tecnológica. De 2001 para cá, o número de mestres e doutores titulados no Brasil dobrou. Só em 2010, 12 mil receberam o título de doutor e 41 mil, de mestre. Na Plataforma Lattes do CNPq, hoje estão registrados mais de 1,7 milhões de currículos, entre os quais 135 mil doutores e 237 mil mestres, distribuídos nos mais de 27 mil grupos de pesquisa cadastrados no Censo 2010 do Diretório de Grupos de Pesquisa. Portanto, o cenário é altamente positivo.
Esses dados são muito animadores, porém o que precisamos melhorar para avançarmos ainda mais?
Glaucius Oliva: Há no Brasil um imenso vale entre a ciência e o mercado, ou seja, ainda existe uma grande dificuldade para transformar o conhecimento gerado em riquezas e serviços úteis para a sociedade. Neste sentido, é preciso aproximar mais as universidades das empresas brasileiras para que estas se tornem mais competitivas no mercado externo. É imperativo disseminarmos a cultura da inovação nas cadeias produtivas, diminuirmos também a burocracia e os custos para o registro de patentes e estimularmos ainda mais os empreendedores tecnológicos. Só assim, com esta sinergia entre o Governo, a academia e o mercado, o Brasil alçará voos mais altos.
De que maneira o CNPq tem participado do crescimento da produção cientifica no Brasil?
Glaucius Oliva: O CNPq é a casa do cientista brasileiro. Foi sempre o principal vetor do desenvolvimento científico e tecnológico do País, naturalmente somado aos esforços de outras agências e órgãos de Governo, como o próprio MCT, a Capes, a Finep e as agências estaduais. Além de prover bolsas de formação e recursos para o fomento a pesquisas, o CNPq mantém um cuidadoso sistema de avaliação por pares, por meio de seus Comitês de Assessoramento, que motiva a comunidade científica e valoriza a exposição dos resultados das pesquisas em periódicos nacionais e internacionais. Também neste contexto, a Plataforma Lattes tornou mais transparente a produção dos cientistas brasileiros. Não há dúvida de que a valorização das pessoas que fazem ciência tem papel central. Pensando nisso, o CNPq introduziu a Bolsa de Produtividade em Pesquisa e, mais recentemente, a Bolsa de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora, que hoje são fundamentais para reconhecer e estimular nossos pesquisadores.
Quais são os grandes desafios do CNPq para esta nova gestão?
Glaucius Oliva: Do ponto de vista da gestão, temos como principais desafios a modernização dos instrumentos de gestão de C&T, com procedimentos de avaliação e acompanhamento que privilegiem a qualidade da ciência e que promovam a inovação e a multidisciplinaridade.e a construção de um novo marco legal que atenda às especificidades do trabalho de pesquisa, desburocratizando importações, compras e contratações, assim aumentando a eficiência na aplicação dos recursos. Precisamos também expandir os recursos de fomento à pesquisa e o número de bolsas oferecidas. Para tanto, o CNPq deve ao menos dobrar seu investimento nos próximos quatro anos, atingindo execução orçamentária próxima a R$ 3,5 bilhões, de forma sustentável e que reflita o planejamento de políticas de Governo articuladas. Outra diretriz nossa será consolidar Programas importantes como os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) e articular uma intensa cooperação com nossas agências co-irmãs, Capes e Finep, em um grande esforço pela maior internacionalização da ciência brasileira.
O CNPq concede atualmente mais de 80 mil bolsas. Em sua opinião este número é suficiente?
Glaucius Oliva: É um número expressivo e resultado de um crescimento contínuo, especialmente nos últimos 10 anos. Contudo, sabemos que o CNPq pode e deve oferecer um número maior de instrumentos para promover a capacitação de mão-de-obra qualificada, além de fomentar a geração de conhecimento. Desta forma, nesses quase 60 anos de história, ampliamos o número e as modalidades de bolsas para atender as necessidades do País e continuaremos buscando recursos para expandir não só a quantidade, mas a qualidade das bolsas oferecidas.
Sabe-se que estimular a inovação também é uma importante missão do CNPq. Neste contexto quais são os planos para inovar o setor de pesquisas científicas no País?
Glaucius Oliva: A ciência brasileira não pode deixar de aprofundar ainda mais seu compromisso com o desenvolvimento econômico e social do País. Para tanto, precisamos implementar novos e mais eficientes instrumentos de estímulo à inovação, no ambiente acadêmico, mas principalmente, nas empresas. Áreas estratégicas e portadoras de futuro devem ser priorizadas, como a química industrial verde, fontes alternativas de energia e em especial a bioenergia, a produção de alimentos, a nanotecnologia, as tecnologias de informação e comunicação, a Amazonia e o Mar, e o apoio inovador à indústria de transformação. Entretanto é importante ressaltar que o CNPq já desenvolve ações voltadas para a Inovação, como o Programa RHAE e um conjunto de modalidades de bolsas de Fomento Tecnológico, especialmente criados para agregar pessoal altamente qualificado em atividades de P&D nas empresas. No campo da ciência básica, temos que estimular a busca pela fronteira do conhecimento, em editais nos quais o protagonista seja predominantemente o projeto de pesquisa e não apenas o histórico do proponente.
O livro Azul, caderno especial lançado no final do ano passado com as propostas apresentadas pela 4° Conferencia Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação (CNCTI), enfatizou a importância de juntar esforços para melhorar a qualidade da educação do País. Para o senhor de que forma a baixa escolaridade e a falta de mão-de-obra qualificada da população brasileira inibem o efetivo avanço da pesquisa?
Glaucius Oliva: O grande desafio desta década é garantir a todos os brasileiros uma educação de qualidade, a começar pela básica, pois a infância é a época mais importante e mais eficaz para estimular o senso crítico tão necessário para produzir Ciência. Se não incentivarmos os jovens desde cedo a gostar de ler, contar e experimentar a Ciência, dificilmente teremos no futuro profissionais qualificados para os grandes projetos previstos para os próximos anos, como na área de petróleo, bioenergia, saúde, tecnologias de informação e comunicação, para a exploração sustentável dos biomas, entre outras áreas estratégicas que requerem mão-de-obra especializada.
O CNPq tem alguma ação voltada para tentar minorar esse dado negativo?
Glaucius Oliva: Sim, várias. A começar pelos editais específicos que buscam valorizar as atividades de divulgação e educação científica em todas as áreas, em particular em matemática e ciências. O CNPq apoia as Olimpíadas Científicas, as Feiras e os Museus de Ciências, que são importantes instrumentos de melhoria dos ensinos fundamental e médio, além de estimularem os jovens a seguirem carreiras científico-tecnológicas. Para despertar a vocação científica também oferecemos as bolsas do tipo Iniciação Cientifica Júnior, que incentivam talentos potenciais entre estudantes do ensino fundamental, médio e profissional da Rede Pública. Creio que é impossível desenvolver ciência e tecnologia sem nos focarmos em uma educação de alta qualidade. Por isso, é necessária uma política de Estado que dê continuidade aos avanços conquistados e que perpasse os vários setores do Governo com esforços conjuntos nos níveis municipal, estadual e federal.
Em sua opinião, quais áreas precisam ser mais estimuladas/reforçadas no Brasil?
Glaucius Oliva: Creio que seja a área das engenharias, pois existe uma escassez generalizada de engenheiros no País. Apesar de ter crescido nos últimos anos, essa é uma área da graduação que está aquém das nossas necessidades. Hoje, o Brasil forma de 30 a 35 mil engenheiros por ano, mas a demanda é muito maior. Do total de alunos que fazem cursos superiores, somente 5% estão nas áreas da Engenharia; já na China, esse percentual chega a 30%. E, para piorar a situação, muitos engenheiros desistem de continuar na área por falta de estímulo. Isso precisa ser rapidamente modificado. Agora, é preciso juntar esforços e planos para incentivar mais jovens para essa área e valorizar os que já estão envolvidos, proporcionando a estes uma formação ampla, sólida e contínua. Só assim seremos capazes de responder aos desafios do desenvolvimento brasileiro.
A entrada recente do desenvolvimento social na agenda da ciência e tecnologia foi um importante passo político. De que forma a ciência e a tecnologia podem contribuir para diminuir as desigualdades do Brasil?
Glaucius Oliva: A inclusão social é um dos grandes desafios do século. Em nosso País, por mais que tenhamos feito grandes avanços neste aspecto, ainda existe um enorme fosso no tocante à distribuição da riqueza e do acesso aos bens materiais, culturais e, em particular, à apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos. Inúmeras ações e programas vêm sendo consolidados no Brasil no sentido de articular, fomentar e promover a difusão do conhecimento científico e tecnológico em todas as regiões do País, a exemplo dos programas realizados pela Secretaria de C&T para Inclusão Social. O CNPq tenta minorar essa desigualdade lançando inúmeros editais que buscam ampliar e estimular o desenvolvimento regional. Em geral, disponibilizamos também 30% dos valores totais de cada edital para projetos coordenados por pesquisadores vinculados a instituições sediadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, numa tentativa de desconcentrar a produção cientifica, que hoje se concentra muito na região Sudeste e Sul. É preciso também estimularmos ainda mais o setor empresarial a promover ações de responsabilidade social e criar novos programas que difundam a apropriação e o uso da C,T&I para o desenvolvimento local e regional. A Ciência é um forte mobilizador para melhoria das condições de vida no campo ou na cidade, o que precisamos é não parar de trabalhar até que ocorra a verdadeira popularização da ciência em prol do desenvolvimento social.
Qual a importância de incentivar a pesquisa científica e tecnológica para o desenvolvimento da Região Amazônica?
Glaucius Oliva: Tanto por suas riquezas naturais quanto culturais, a Amazônia representa hoje um manancial de oportunidades para pesquisas. Estamos vivendo em um novo contexto mundial, no qual se valoriza mais a biodiversidade, as florestas tropicais, a água e os recursos minerais. Neste sentido, é preciso produzir mais informações sobre o bioma amazônico para reduzir o desmatamento, fomentar a inclusão social e principalmente estimular atividades de C,T&I na região. Uma ótima notícia é que dos 122 INCTs 8 estão na Região Amazônica, fruto de uma exitosa parceria do CNPq com os Estados do Amazonas e Pará. Porém certamente há ainda muito espaço para ampliar a formação de recursos humanos qualificados na região e estabelecer ações que atraiam empresas de base tecnológica voltadas para a biodiversidade, bem como estimular programas que busquem reduzir ou mesmo erradicar as carências sociais. É preciso definitivamente ampliar as fronteiras do conhecimento para assegurar que todas as regiões tenham plataformas tecnológicas com qualificados centros de pesquisas, cada um com as características e especificidades de sua região.
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